Porque desde a minha tenra idade até os dias atuais, eu observo, aprecio e degusto as comidas feitas pela minha mãe, Dona Lena, uma mulher preta! Canjica, Cuscuz, Bolos, quindins, feijoadas, feijão branco com dobradinha, rabadas, mocotós estão entre os quitutes cozinhados por ela. Enfim, como bem definiu minha orientadora Fernanda Delvalhas Piccolo, em conversa recente, “ela cozinha comida preta brasileira”.

Porque na minha trajetória de vida, consta momentos de interação com as comidas ofertadas nas festividades de entidades em espaços religiosos de matriz africana…E vamos de comer doces nas festas dos Ibeji e as feijoadas dos Pretos Velhos!

Porque sempre como “com os olhos” as comidas de rua de diferentes espaços públicos e tão presentes nas nossas vivências cotidianas. É difícil não comprar estas iguarias!

Porque desde a primeira década dos anos 2000, eu, um produtor cultural preto, atuando no mercado de trabalho da cultura, tenho curiosidades, indagações e inconformidades sobre as relações sócios-culturais-econômicas que organiza a nossa sociedade, e que por consequência estrutura o setor cultural.

Porque a partir da segunda década dos anos 2000, sobretudo de 2010 a 2016, já cursando o bacharelado em Produção Cultural pelo IFRJ/campus Nilópolis, entro numa era de descobertas de saberes oriundos de diversas fontes. Desde os estímulos à pesquisa e às leituras de intelectuais da alimentação e cultura propostos pela antropóloga Fernanda Delvalhas Piccolo na tutoria do Programa de Educação Tutorial (PET) e na ministração da disciplina Cultura Afro-brasileira. Os conhecimentos orais apreendidos nas inúmeras conversas com minha contemporânea de graduação, Sandra Regina, mulher preta e praticante dos cultos religiosos de matriz africana. Nos planejamentos e execuções de atividades extensionistas em parceria com os companheiros de PET Conexões de Saberes em Produções. Nesse sentido, a realização da oficina “Quitutes: A conversa saiu da cozinha” manteve todo rito de técnicas necessárias para a sua realização nos espaços formais de educação, mas foi temperada com conhecimentos advindos de outras epistemologias. Apresentamos uma mesa com diversos alimentos e comidas com intuito de estimular os diferentes sentidos nos participantes. Estimulamos a audição de músicas como, Cocada, do compositor Roque Ferreira, que nos remete ao uma experiência afro empreendedora secular ou ao ouvir Emílio composta por Jorge Ben Jor, que em seus versos faz um jogo sensual com comidas afro-brasileiras, despido de qualquer moralismo presente em outras matrizes estruturadora na nossa sociedade.

Porque os dissabores e a escassez teimam  manifestar-se com as intolerâncias étnico-cultural-religiosa, com a pouca visibilidade dos chefs negros e as dificuldades da efetivação das leis 10.639 e 11.645, que instituem a obrigatoriedade do ensino de Histórias e Culturas africanas, afro-brasileiras e indígenas nas escolas brasileiras.

É por tudo isso e por trocas de saberes e sabores que ainda estão por vir, que eu converso sobre cozinhas africanas e afro-brasileiras no blog A Conversa Saiu da Cozinha.